Discurso de posse


Discurso Proferido pelo Acadêmico João Francisco Vaz Sepetiba a  seu Patrono, Coronel José Honório da Costa, .no dia 20 de março de 2003, na Academia Catarinense de Letras.


A data de treze de fevereiro de 2003 ficará indelevelmente gravada em nossa lembrança, pois reverenciará, sempre, a efeméride que deu origem à vitoriosa Academia de Letras de Palhoça, cidade que norteará a todos nós acadêmicos, com a finalidade precípua e única de resgatarmos o seu passado airoso e fecundo, o presente repassado de glórias, e o futuro, certamente, resplandecente e iluminado.

Não envidaremos esforços e trabalharemos denodadamente, todos nós, para mantê-la altaneira, ostentando o galardão maior da cultura e da tradição de nosso soberano Estado de Santa Catarina. À guisa de esclarecimentos e para mostrar a importância de Palhoça no concerto e na amplitude de nosso abençoado rincão natal, declinaremos os nomes de dois de seus filhos mais ilustres, quais sejam, o Dr. Ivo Silveira, que governou de maneira profícua e estóica Santa Catarina, por um lustro ou qüinqüênio, e o Dr. José Boabaid , que também dirigiu os destinos de nosso Estado com proverbial competência e determinação.

Todavia, preceituam os ditames de nossa Academia que falemos de nossos patronos. E é com muita honra e contentamento que procuraremos enfocar, em rápidas pinceladas, a vida de meu bisavô, Coronel José Honório da Costa, descendente direto de Thomaz Francisco da Costa, de onde proveio a numerosa família Costa de Santa Catarina. É imperioso salientar que foi Antônio José da Costa, nascido no Desterro, em 1751, filho de Thomaz Francisco da Costa e Mariana Jacinta Vitória, quem fora incumbido de estudar a topografia e fazer a picada inicial para a abertura da estrada que ligaria, definitivamente, Lages a Desterro, isso no longínquo e distante ano de 1787, naturalmente com as grandes dificuldades e com a falta de recursos que a época impunha. Essa tarefa heróica e hercúlea, que despendeu ingentes esforços braçais, redundou na realidade que todos hoje podemos admirar e desfrutar: a bela Br-282, que liga Florianópolis a Lages. Eram progenitores de meu bisavô, Coronel José Honório da Costa, Laurentino e José da Costa e Prudência Costa.

Meu bisavô convolou núpcias com Alexandrina Ávila da Costa, provindo da benfazeja união duas filhas, Alice da Costa Vaz, que viera a casar-se com o pecuarista e fazendeiro, João Vaz Sobrinho, proprietário do matadouro de bois no bairro Estreito e fornecedor único da carne bovina que era consumida em Florianópolis. Meu avô, João Vaz Sobrinho, era um grande estancieiro, pois possuía a fazenda Figueiredo, em Bom Retiro, de onde provinha o gado para ser abatido, e também o Pasto do Gado, no Estreito, para onde era conduzido o rebanho bovino.

A irmã de minha avó chamava-se Eugênia Ávila da Costa Valente, pois viera a casar-se com Domingos Valente, proprietário da então Companhia de Força e Luz de Lages, isso nos primórdios do século XX.

Com a preocupação maior de educar suas duas únicas filhas, Alice e Eugênia, meu bisavô, Coronel José Honório da Costa, deixa sua imensa fazenda Capitão-mor em Bocaina, distrito de Lages, aos cuidados dos bons e fiéis capatazes e peões, assim como sua vivenda em Lages para vir morar, definitivamente, em Palhoça, com toda a sua família. Como era um homem de posses, adquiriu uma vasta gleba de terras e uma casa que desse o conforto a que sua prole estava acostumada. Sem maiores delongas, instalou em Palhoça uma casa comercial com o que de mais moderno havia à época. Os paquetes e veleiros que aportavam na Desterro de outrora traziam cristais da Alemanha e da Áustria, perfumes da França, vinhos de Portugal, tecidos da Inglaterra, os quais eram comercializados em sua loja de Palhoça e também vendidos em Lages e outras cidades do Planalto Serrano. Para seu lazer, adquire uma ampla área de terras no lugarejo denominado Passa-Vinte, onde descansava periodicamente.

O Coronel José Honório da Costa, já perfeitamente integrado à sociedade palhocense e trazendo seu labor diuturno para o progresso sempre crescente do município, também participou ativamente da vida política, social e econômica da cidade. Por ocasião da instalação da comarca de Palhoça em 1906, em nome do Conselho Municipal, proferiu uma alocução candente e veemente, em regozijo pelo auspicioso e alvissareiro acontecimento.

É imperioso salientar que meu bisavô foi prefeito de Palhoça. A acolhedora e bela cidade, com seu povo hospitaleiro e trabalhador, homenageou-o colocando o seu honrado nome em uma de suas vias públicas. Falaremos agora sobre as vicissitudes e percalços que teve de enfrentar na sua fazenda Capitão-Mor, em Bocaina. Apesar do alentado rebanho bovino que possuía, o Coronel José Honório da Costa, era comum seus bravos e dedicados peões encontrarem ossadas ao longo de sua fazenda. É que os bugres selvagens da região, bastante hostis e belicosos, abatiam o gado com flechas para se alimentarem.

Como essa atitude dos silvícolas, não tivesse um paradeiro, o Coronel José Horácio da Costa  teve a ajuda inestimável e prestimosa do seu grande e eminente amigo, Vidal Ramos, o qual mandou buscar em Palmas, no Paraná, um casal de bugres acultuados e domesticados, para aplacar a ferocidade irrefreável dos índios bravios de sua fazenda Capitão-Mor. Conta minha mãe, Maria de Lurdes, Luluda, que os peões e capatazes ficavam sempre protegendo a casa grande da fazenda, assim como as outras menores, para que os silvícolas não os importunassem. Diz ela ainda, que o casal de índios, para confabular com os habitantes arruaceiros e difíceis, andava dia e noite sem parar, por dentro dos rios, a fim de evitar deixar rastro e ser seguido. Fato interessante, narrado por minha progenitora, eram as extensas fogueiras feitas pelos bugres à noite. Eram intermináveis, e serviam para que eles se deitassem ao longo delas, com os pés voltados para o calor. Eles assim procediam porque o fogo fazia com que a sola de seus pés se tornasse um couro bastante grosso e resistente para enfrentar os espinhos e pedregulhos que tivessem de arrostar nas florestas, nas suas permanentes incursões.

Certa feita, os silvícolas para terem uma visão do interior da casa grande, subiram no forno externo que ficava ao lado provocando seu desabamento, o que demandou grande correria, pois os silvícolas saíram lepidamente perseguidos pelos capatazes, peões e cachorros.

Sem maiores digressões, vejo-me no inabalável dever de frisar, para elucidar quem foi o Coronel José Honório da Costa, que ele foi um homem que esteve sempre à frente de seu tempo, com sua arguta inteligência, seu devotamento ao trabalho, sua férrea lealdade, e seu aguçado espírito empreendedor. O Embaixador Licurgo Costa asseverava, com certo orgulho, que a família Costa é um dos mais ilustres troncos do Brasil.

O Coronel José Honório da Costa nasceu em Lages, em 1860, quando o Brasil enfrentava a Guerra Cisplatina contra o Marechal Solano Rosas e lutava contra as tropas do Paraguai, e veio a falecer na sua fazenda do Passa-Vinte, no Município de Palhoça, nos idos de 1943, em plena efervescência da Segunda Guerra Mundial, com a provecta idade de 83 anos. Seus restos mortais jazem no cemitério do Passa-Vinte, em Palhoça, ao lado de sua dileta e amada esposa, Alexandrina Ávila da Costa, que viera a ter seu desenlace antes dele.

Antes de concluir, é necessário dizer que o "vô Juca" é digno e merecedor de ser patrono de uma das quarenta cadeiras da Academia de Letras de Palhoça.

Foi, no seu tempo, um homem de destaque e de muita importância na região. Quando veio a morar em Palhoça, que ainda não era município, teve desempenho preponderante nas desavenças e entreveros havidos entre republicanos e imperialistas, logo após a Proclamação da República.

Homem instruído e culto, a par do que se passava em todos os países do mundo, o Coronel se deu conta de que o império no Brasil era uma página virada, e se converteu num republicano convicto.

Por isso, foi duas vezes prefeito de Palhoça. Pessoas com passado tão glorioso não podem ser esquecidas ou olvidadas. Se outro mérito não tivesse para ser patrono de uma cadeira na Academia, teria sempre a gratidão dos filhos desta terra, que, grande e altaneira, sabe fazer justiça a quem bem merece.


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